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CALYPSO, ULISSES E BEM VIVER NA MODERNIDADE LÍQUIDA


Na obra “Odisseia”, de Homero[1], conta-se a história – ou a estória – de Odisseu, o Ulisses. No retorno a Ítaca, que é o objetivo de Ulisses no livro, o personagem sofre uma “emboscada”, realizada por Poseidon – deus dos mares – e fica preso na ilha de Calypso, outra deusa da mitologia grega.

A ilha e a deusa tinham tudo aquilo que pudera ser desejado. Ulisses tinha segurança de uma vida boa. Por que desbravaria para voltar a Ítaca, seu lugar, e encontrar Penélope e Telêmaco?

O que é boa vida? Hodiernamente, poderia dizer que a boa vida é aquilo que as estruturas sociais as quais estou envolto me limitam a escolher. É a repetição de rotinas e os padrões de comportamento aceitáveis a determinada Sociedade, aqui em Bauman[2].

É aquilo que, silenciosamente, sou exposto e sou reflexo, durante a edificação do “eu”. Replico essa construção buscando reconhecimento, aqui em Bourdieu[3].

Acontece que, na fase sólida, como compreende Bauman[4], a previsibilidade das interações sociais era maior e esta fase se transmudou à liquidez moderna.

Não há certezas. As próprias organizações sociais não mantêm suas formas por muito tempo, aqui em Bauman[5], e o laços humanos são temporários.

O conceito de interregno, de Bauman[6], é vivo. Não somos uma “coisa” ou outra. As estruturas se modificaram e modificam-se constantemente.

Vivemos em permanente instabilidade política e jurídica. Há, a meu ver, período de Revolução na Ciência, em Kühn[7].

Todas as formas que visam soluções ainda “engatinham”. O poder da tecnologia é desconhecido. Não há visão a longo prazo, de finitude (e tudo o que é finito quedamos a conferir maior valor).

Mas não só a tecnologia nos “amedronta”. A competição entre os seres é acirrada e mais riscos são agrupados. Riscos que, conforme Beck[8], são distribuídos desigualmente na Sociedade.

No mundo globalizado, não raro, danos e descuidos sociais – ingerências – resultam em perdas planetárias. Ninguém é inocente ao mal-estar de uma civilização.

O novo que assola o ser envolvido, como se não bastasse, ainda, é diuturnamente aproveitado e, em razão das mazelas educacionais de nosso país, torna-se entretenimento.

A crise das estruturas sociais – recorrentes – cria espécies de “plantas sociais”[9], inimigos fantasmas. Ou estrangeiros, como quiser.

Se não me adequo facilmente, nesse contexto, a estruturas sociais – que se modificam constantemente -, recebo o medo da inadequação[10]. Procuro informações e a elas tenho amplo e infinito acesso. Entretanto, não tenho certeza sobre as informações. Serão elas muito superficiais?

Seria a desconexão a ítaca (no sentido de boa vida, de local ideal) da atualidade? O admirado mundo novo, novo de hoje, é a distopia de Huxley[11]?

[1] HOMERO. Odisseia. Tradução de Cristian Werner. São Paulo: Cosac Naify, 2014. [2] BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. Título Original: Liquid Times. [3] BOURDIEU, Pierre. Meditações Pascalianas. Tradução de Sergio Miceli. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. Título Original: Meditations pascaliennes. [4] BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. [5] BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. [6] BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. [7] KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 5.ed. São Paulo: Perspectiva, 1998. Título Original: The Structure o f Scientific Revolutions. [8] BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. 1 ed. São Paulo: Editora 34, 2010. Título Original: Risk societty: towards a new modernity [9] O contexto atual rememora a obra “Os Sertões, de Euclides da Cunha. Ao descrever sobre “As caatingas”, em Canudos, destaca, como espécie de vegetação, as favelas, “anônimas ainda na ciência – ignoradas dos sábios, conhecidas demais pelos tabaréus – talvez um futuro gênero cauterium das leguminosas”. Elas, “unem-se, intimamente abraçadas, transmudando-se em plantas sociais” (CUNHA, Euclides. Os Sertões. São Paulo: Três, 1984. p. 41) (GUDYNAS, Eduardo. Ciudadania ambiental y meta-ciudadanias ecológicas: revision y alternativas en America Latina. Desenvolvimento e Meio Ambiente. n.19. jan/jun 2009. p. 61. Disponível em: . Acesso em: 22 set. 2019). Retirado de: PEDRINI, Tainá Fernanda. Ecoeficiência: como a sustentabilidade pode acrescer à atividade empresarial. 1.ed. Florianópolis: Habitus, 2020. p. 35. [10] BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. [11] HUXLEY, Aldous. Admirável mundo novo. Tradução de Vidal de Oliveira. 22.ed. São Paulo: Globo, 2014. Título Original: Brave new world.”

Imagem retirada da plataforma Wix.

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